I am Not Your Negro
26 AGO // 17h30 // Auditório da Fortaleza de Sagres
entrada livre, com reserva obrigatória para ccf@cineclubefaro.pt
I AM NOT YOUR NEGRO
Raoul Peck, França/EUA, 2016, 93', M/12
Em 1979, o poeta e ensaísta James Baldwin escreveu ao seu editor dizendo que o seu próximo projecto, Remember This House, seria um livro revolucionário sobre as vidas e os assassinatos de três dos seus amigos mais próximos: Medgar Evers, Malcolm X e Martin Luther King, Jr. - os três maiores líderes negros da década de 1960. A obra analisa a história do racismo, assim como o tratamento dado às minorias em território norte-americano.
Quando morreu, em 1987, deixou apenas 30 páginas do manuscrito. O manuscrito inacabado foi confiado ao realizador haitiano Raoul Peck que, combinando textos e imagens de arquivo em que o autor expôs os seus pensamentos, decidiu fazer um documentário sobre o tema. Este documentário extraordinário, narrado pelo actor Samuel L. Jackson, dá voz às palavras de Baldwin e, usando preciosos materiais de arquivo, volta a trazer para a ribalta as questões raciais na América. "Eu Não Sou o Teu Negro" é uma reflexão sobre as lutas históricas pela igualdade de direitos e a forma como o tema se mantém actual e pertinente no contexto do século XXI. Estreado no Festival de Cinema de Toronto (Canadá), foi nomeado para o Óscar de Melhor Documentário.
Sessão de 26 de Agosto - referente ao dia 23 de Agosto - Dia Internacional em Memória do Tráfico de Escravos e da Sua Abolição
O dia 23 de Agosto tem vindo a ser assinalado pela ONU desde 1998, como um marco que tem por objetivo relembrar a revolta que ocorreu na noite de 22 para 23 de Agosto, de 1791, em São Domingos, antiga colónia francesa nas Antilhas, território que corresponde atualmente ao Haiti e República Dominicana, e que marca o início do fim da escravatura e da desumanização, levando à abolição do tráfico transatlântico de escravos.
Este capítulo da história mundial deve servir de lição para “desconstruir os mecanismos retóricos e pseudocientíficos” que viabilizaram o crime da escravatura e da escravidão mas também do racismo estrutural e da continuidade do preconceito e descriminação que persistem até aos dias de hoje.
No ciclo de cinema Libertar a Memória, o curador desta sessão, Suzano Costa traz-nos este filme poderoso e crítico, justamente de um cineasta haitiano, Raoul Peck, que liga uma história desconfortável aos movimentos presentes de luta e reivindicação contínua de direitos cívicos e igualdade, dando voz aos escritos e reflexões de James Baldwin.
Mas segundo as palavras de Luís Miguel Oliveira do Jornal Público “a representação cultural precede a representação política, e as palavras combativas de Baldwin voltam insistentemente a este ponto – contar a história dos negros americanos, antes e depois do movimento pelos direitos cívicos, é contar a história de um segmento da população que, durante décadas (ou séculos), não teve direito, pelo menos a uma escala massificada, à auto-representação. Viveu com imagens criadas por outros, retratos de “criaturas que existem apenas na imaginação dos brancos” (dixit Baldwin).
O realizador Raoul Peck demonstra que os pensamentos e as causas de Baldwin [1924-1987], escritor mal conhecido e pouco traduzido na Europa, continuam a ecoar no presente. E no cinema. Num filme que recorre a muito material de arquivo mas também a imagens novas que filmou na actualidade, constata-se que essencialmente, pouco ou nada mudou A América que nunca soube pacificar a relação entre as raças, e que ainda hoje, todos estes anos depois da morte do escritor, continua dilacerada por isso.
Mas o que é que isto tem a ver connosco? Baldwin afirma que “a história não é o passado, é o presente, transportamo-la connosco, somos a nossa própria história”. Como quem diz que de nada serve olharmos para isto de fora, achar que não é nada connosco, que isto é uma questão “lá deles”. Não é.
Basta que nos lembremos de quem, quando e como começou toda esta história do tráfico de escravos transatlântico…
Vamos ver, de olhos bem abertos, onde é que isto se cruza com o nosso território, a Europa e a história comum que nos separa - dia 26 de Agosto, porque as nossas sessões são ao sábado, lá estaremos no Auditório da Fortaleza de Sagres à vossa espera.
Luísa Baptista sobre Libertar a Memória - Sessão 26 de Agosto - I am Not Your Negro, Lagos, 2023
Curadoria cinematográfica: Suzano Costa
Suzano Costa é investigador do Observatório Político. Licenciado, Mestre e Doutor em Ciência Política, na especialidade em Teoria e Análise Política, pela Universidade Nova de Lisboa, obteve, ainda, uma pós-graduação em Política Comparada pelo ICS-UL e em Eleições e Sistemas Eleitorais pelo IHC-FMS. Foi bolseiro da Fundação para a Ciência e Tecnologia, tendo sido distinguido com o Prémio “Mérito & Excelência” (UNL), o Prémio “Fórum D&C” (IMVF) e o Prémio “2D’s” (IDD). Exerceu funções no Secretariado-Executivo da Associação das Universidades de Língua Portuguesa, foi fundador da Tertúlia Crioula e dinamizador de várias iniciativas cívicas, académicas e comunitárias. As suas publicações mais recentes incluem os livros Entre África e a Europa: Nação, Estado e Democracia em Cabo Verde (Almedina), As Relações Externas de Cabo Verde: (Re) Leituras Contemporâneas (ISCJS) e Estado e Qualidade da Democracia em África: entre a Letargia Cívica e a Omnipresença Leviatã (Principia).