Sombras Brancas
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Categoria hospedeira: Programação
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in Ciclo do mês
Dia 24 (4ªF) | CLUB FARENSE | 21h30
SOMBRAS BRANCAS
Fernando Vendrell, PT, 2022, 114’, M/14
sinopse, ficha técnica e trailer: aqui
nota do realizador
Li, no momento da sua primeira edição, De Profundis – Valsa Lenta de José Cardoso Pires. É uma obra única do ponto de vista literário e humano e reparto com o escritor esta obsessão da importância da memória como evidência do humano.
A afetação das capacidades cognitivas do autor através de um AVC, localizado no lobo da linguagem e da comunicação, ficou reportada em obra literária com laivos biográficos. Ao lermos este livro, somos cúmplices de um “ato médico” que surpreende a ciência e questiona filosoficamente a existência humana, confrontando-a com o surreal.
Em 2012, perante a fragilização da memória dos meus pais, esta adaptação cinematográfica começou a tomar forma e tornou-se uma obsessão pessoal. Pareceu-me ser este um tema extraordinário para um filme.
A obra de José Cardoso Pires foi pesquisada e elencada para a escrita do argumento cinematográfico, a sua família respondeu às perguntas que tanto eu como o Rui Cardoso Martins (coargumentista) lhes fizemos, trazendo-nos outras questões e contextos para o projeto.
Filmado no pico da segunda vaga pandémica, entre Novembro e Dezembro de 2020, e montado em confinamento, este filme foi também uma experiência limite em que eu, o elenco e a equipa técnica, nos confrontámos com a fragilidade humana. Estávamos a filmar num hospital, num momento em que os serviços de saúde já não comportavam o número de doentes afetados e em que milhares de pessoas não sobreviviam. Fomos forçados a isolarmo-nos para sobreviver.
O filme surgiu também deste contexto, através desta evidência implacável. É hoje enorme a gratidão que sinto por todos os que em mim confiaram, que arriscaram e que contribuíram para o surgimento inesperado desta obra.
Agora projetado em sala de cinema, parece haver pouco a acrescentar. A sala cinema é para mim um espaço criativo solitário, onde o espectador contemporiza a sua memória com impressões e vivências inexplicáveis. Também o meu cinema plasma sensações e emoções por mim vividas e remete dúvidas e questões que procuram resposta.
Sombras Brancas assemelha-se a uma alegoria biográfica de José Cardoso Pires, mas é também um filme que reporta a experiência de ser e de viver hoje, um gesto que ambiciona a alegria.
notas críticas
“Sombras Brancas” [...] parte da situação de afasia nela descrita para efetuar um trajeto pela vida e obra do escritor, caldeando biografia e literatura.
[...] No filme, Cardoso Pires não fica vazio, plana, desliza, vagueia por uma massa de factos e de trâmites ficcionais. Jorge Leitão Ramos, Expresso
“Como acontecerá a alguns outros, eu vi este filme de Vendrell com o coração nas mãos, sobressaltada a cada imagem, e no final, amando-o e, mesmo sem ter direito a isso, agradecendo imensamente por isso mesmo, que o realizador tenha dedicado uns bons anos da sua vida a um escritor que criou um livro tão poderoso como é O Delfim, e depois, um dia, mergulhou na duna branca onde a sua obra permanece.”, diz Lídia Jorge a respeito do filme para o Jornal de Letras.
Sombras Brancas é um filme à altura da ambição que se propõe, ou seja, traçar com eficácia um recorte paradoxal da vida de José Cardoso Pires e sobre o seu esquecimento da palavra. Nesse sentido, é uma ideia inteiramente conseguida. Paulo Portugal, comunidade cultura e arte
outras leituras
O escritor que esqueceu como escrever. Ana Figueiredo, Agenda Cultutal Lisboa